segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

O menino das pétalas pretas

Já há algum tempo eu estava ansioso para pegar a menininha na porta da escola, como tinha prometido...

Agora, tudo que eu consigo me lembrar é a cena.


[saída temporal]


Eu não deveria ter chamado seu nome... Eu e essa minha mania de fazer alarde sempre dá nisso. O fato que na hora em que cheguei, ela estava de costas, com os cabelos amarrados feito um rabo-de-cavalo, os livros numa mão. E com a outra mão ela segurava a mão do menininho, que conseguia ser ainda menor que ela...

E como ele era frágil e belo, parecia um anjo sendo cuidado pela minha garotinha...

Um menininho todo feito de pétalas de flores pretas... Parecia até sonho, eram flores de fato, não que eu precisasse de confirmação, mas só pra registrar, eram flores de fato. Ele nem se mexia. Ela o segurava pela mãozinha como se fosse feito de cristal.

Se eu fosse mais calmo poderia me aproximar primeiro sem evocações, (uma coisa tão simples, tão pura, não resiste a isso) e sentir seu perfume, junto à garotinha... Mas esses meus vícios provocam isso, deixam as atitudes fraternais sempre no campo das idealizações... E eu já há algum tempo prometi não me martirizar, porém de ser patético eu não escapo.


[regresso]


Eu chamei seu nome e na hora que ela se virou e soltou sua mão. Ele caiu pra frente, relativamente sólido, como uma flor que desabrochou há pouco e desmanchou... Agora o vento se encarregará dele.

Enfim... Enquanto a garotinha me olhava, tudo que eu podia fazer era olha-lo. E lamentar.






outono de 2007





Um comentário:

Aline Zouvi disse...

"E eu já há algum tempo prometi não me martirizar, porém de ser patético eu não escapo." Essa frase meio que resume a minha vida. Lindo texto, muito leve.